segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

Nossas Autorias #001 - Logo Hoje?

 
 
 
Por Diego Oliveira
 
 
Quando você não quer, ele sempre vêm. Sempre reparo nisso: eu poderia estar no horário, ou simplesmente atrasado (como sempre), mas é assim: logo hoje, que a gente não precisa dele, aí que ele aparece!

Têm sido assim, fazer o quê?
 
Às vezes chego a pensar que há uma conspiração contra mim. Talvez seja Deus, talvez seja as forças do universo, ou até pode ser coisa da minha empregada, que teima em não engomar direito minhas camisas. O fato é que algo acontece. Não me atraso de propósito! Ou será que já até me acostumei com isso? Vai saber?
 
Agora é sempre isso. E lá vem ele, vazio e imponente. Parece se gabar da minha desgraça. Já somos tão íntimos que ouço até seus sussurros zombeteiros: "O que é que há, imbecil? Vai ficar parado aí, me vendo desfilar? Hoje não sou eu que vou te ajudar! Vai se danar outra vez!". Maldito seja, eu não podia me atrasar...
 
Aliás, maldita seja a hora que vim parar nesse fim de mundo. Aqui até que é um lugar legal, mas longe de tudo, não me serve. E a qualquer passo que eu tenha que dar, lá se vão duas horas pra chegar onde tenho de ir.
 
Enfim, estes devaneios não me serão úteis a essa altura do campeonato. A culpa é dele e somente dele. E ainda tem a pachorra de parar, agora, todo displicente aos meus olhos. Só de saber que não me acompanhará hoje em meu trajeto, parece até estar mais garboso que de costume.
 
E o que me espanta, é que além a chuva e do frio, parece que não estou sozinho nisso. É provável que também seja um dia atípico para essas pessoas, paradas aqui comigo. É uma pena que a minha limitada coragem não é digna de compartilhar de meus pensamentos com os demais que, assim como eu, devem estar atrasados. Precisamos de outro, e não deste estorvo, que está parado na nossa frente.
 
É, esse parece ser meu desafortunado destino: ficar estacionado, levando chuva na cabeça e demorando a chegar onde tenho de ir. Fui premiado com esse fito para minha existência, só pode! Nem um abrigo da chuva, essa droga de lugar tem. Que saco!
 
Olha lá, agora ele vai embora. É muita petulância mesmo. Isso, vá. E vá logo, pois não preciso de você. Queria não precisar nunca mais, e rezo para que um dia isso aconteça! Porcaria, ainda quase me molha. Que sacanagem...
 
Ah, se eu desse voz à meus pensamentos. O máximo que consigo fazer é manear negativamente a cabeça, como estou fazendo agora. Tem horas que isso me atordoa. Nesta vida, se contarmos as horas que eu já perdi aqui, esperando, me cansaria só em tentar fazer isso. É nessas horas que me sinto um lixo, aliás, mais que um lixo: nem para isso eu presto.
 
Será que estou mais de meia hora parado aqui? É, parece que o relógio da padaria diz isso. Mas é muito azar mesmo. Ele me viu? Veja só: nem o meu vizinho presta. Há essa hora da manhã, e o Matias já bebendo. Povo medíocre desse lugar!
 
- Tá atrasado, moribundo? - Sim, ele me viu, gritando de lá - Entra aqui, toma um café comigo!
 
Acho que ele pensa que vou me rebaixar à tal ponto. Idiota. Deve ser mais um dos meus devotos sem causa, pelo menos é o que eu acho.
 
- Obrigado, Matias. Estou atrasado, fica para a próxima.
 
Nesse instante, ele começa com aquele negócio de tomar o trago de uma golada só. Duvido que ele vá ter o ímpeto de vir ao meu encontro desta vez. A gente fica sem saber se ele vêm ou não. Qual será a desse cara? E não é que ele está vindo! Que vergonha, meu Deus. Esse sujeito deve estar ficando gagá mesmo.
 
- Ora rapaz, tomar um café com seu amigo não vai te matar. E eu sei que...
 
Me esquivei do abraço torto.
 
- Olha Matias... - Olho ao redor. - Lá vem ele: o meu ônibus. Fica para a próxima.
- Mudou o caminho hoje? Ou é por minha causa? Você não me engana, o que vai pra estação já passou há uns...
- Tenho que ir à missa! - Fui falando enquanto subia os benditos degraus do coletivo. - Deixa para depois.
 
Fui sentar, como sempre, na mesmo banco de sempre. Vi da janela ele balbuciando alguma coisa, e me sorrindo aquele sorriso amarelado e falho, o que mais se assemelhava à um selvagem. Acenei satisfeito com a cabeça, enquanto ele me via seguindo adiante.
 
O que será que ele disse? Deve ser algo sobre eu não ser católico, ou que não era hora de missa. O que importa...  Não foi hoje que nem o maldito ônibus, nem o bêbado Matias me interrompem. Pode ser porque eu realmente esteja indo para a igreja. Mas quem iria acreditar?

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