sábado, 31 de dezembro de 2016

Dicas de Leitura #010 - Um Bocadinho de Saramago


Portugal é a pátria-mãe que deu origem a quase tudo que se desenvolveu no Brasil. Inclusive, um dos maiores patrimônios de nossa gente, é, efetivamente, a língua portuguesa. E muito me entristece chegar ao fim de 2016, redigindo este último artigo do ano, com a constatação de mais uma negligencia de nossos governantes acerca da exclusão da obrigatoriedade do ensino de literatura portuguesa nas escolas.

Mas, convenhamos: em raríssimos casos, essa disciplina era ensinada. Então, regulamenta-se apenas o que já era praxe: no Brasil, a última coisa que se preza, em grande parte das escolas, é o ensino em si.

Hei de confessar, neste último texto de 2016, que esta perspectiva obscura do ensino no Brasil, no passado, foi uma realidade para mim. Como um "bom aluno" da educação pública brasileira, sou um leitor tardio, e literatura, nunca tinha sido o meu forte. E aqui, confesso o meu profundo arrependimento por isso, pois ainda não li Camões, não li Fernando Pessoa, mas começo a redenção de minha negligência passada, falando das minhas percepções sobre um dos autores portugueses que li este ano: o, até então, único Prêmio Nobel de Literatura da língua portuguesa: José Saramago.


O filho de criador de porcos que se tornou Laureado:

A história que vou lhes contar é de um mito, que, de palavra em palavra, forjou seu fado, o seu destino em verdade. A história não se faz mistério à ninguém, mas posso crer que é de muitos, desconhecida. Esta minha tentativa, simples, jamais vai remeter a um estilo literário que somente aos gênios compete. Faço-a simplesmente ao meu modo, mas quem sabe possa ser, até, interessante...

Era uma vez um rapagote, nascido no campo e longe da cidade. Seus pais e avós criavam porcos em uma pequena vila, ou freguesia portuguesa, como queiram. A gana de trabalho e a obrigação de levar o sustento à família, converteu-se em migração: do campo a cidade. Mas o campo e as histórias dos velhos sábios interioranos, nunca abandonaram o rapagote que crescia entre capital Lisboa e a aldeia de Azinhaga.

Herdou, olimpicamente, de seu pai, apenas o nome: José de Sousa. Por conveniência do bêbado tabelião que o registrou, recebeu o sobrenome Saramago. A planta de folhas picantes, o saramago, é espontânea num Portugal de campos d'ouros e vindouros. É resistente, sejam em campos cultivados, terrenos incultos ou pequenas searas. Mesmo considerada uma “erva-daninha” era o apelido do pai do rapagote. E do rapagote, para sempre sua marca ficou.

Sua alfabetização, feita de pés descalços, literalmente, carecia de referências. Outrora, diria o rapagote: não tinha sequer um livro em casa. Mas as palavras, mesmo assim, foram de encontro ao gajo. De jornal em jornal, seu pai trazia ao lar, paulatinamente, o adubo que iria fomentar o gérmen do saber e da curiosidade do rapagote pelo o mundo inteiro.

Anos mais tarde, o rapagote se tornaria homem feito. Mal passaria por sua cabeça que um dia, de fato, trabalharia nas fábricas de notícias, que tanto habitaram seu imaginário de menino. Anos mais tarde, o homem se tornaria forjado na secura de um realismo cético e conciso. E já forjado, teve de forjar ferro para sobreviver. Se fez serralheiro de ofício. Já era casado com a jovem Ilda Reis – se casou em 1944 e com quem permaneceu até 1970 – e pai – de Violante dos Reis Saramago. Ou seja, tinha família e tinha de ganhar o pão. Não chegara a faculdade, não tinha recursos. Mas isso, pouco lhe fez falta na vida.


Divulgação - FJS

Rígido de costumes, como qualquer outro trabalhador incansável que sempre busca melhorar, o jovem homem com sobrenome de planta provou da vida seus amores, seus dissabores, seus prazeres e suas mazelas. Os jovens de 1940 tinham uma vantagem sobre os de agora: não haviam PlayStations, nem TV, nem internet. Mas, o homem queria o saber. As palavras lhe seduziam. Para o homem, Saramago de batismo, a sensação que se tinha com um livro na mão era a de se ter tudo!

E foi na sala de leitura do Palácio das Galveias, uma das bibliotecas públicas da cidade luz portuguesa, o agora metalúrgico Saramago, desbravava uma especie de ilha desconhecida, onde se tem de abrir caminhos próprios, sem referências. Não haviam guias para sua imersão literária. Lia tudo: o que sabia e o que não sabia. E foi daí que o homem Saramago passou a exercitar sua escrita, dedicando seus primeiros poemas à sua primeira esposa.

Era, de fato, um legítimo escorpiano. Teimoso e polivalente, teve diversas profissões: desenhista, funcionário da saúde e da previdência social, tradutor, editor, jornalista. Tratou de publicar seu primeiro livro, um romance, "Terra do Pecado", em 1947. O título do livro sempre foi contestado pelo autor, pois originalmente se chamaria "A Viúva". Mas, por sugestão de seus editores à época, cedeu por alterar este pormenor.

Depois de "Terra do Pecado", o escritor Saramago apresentou ao seu editor o livro "Clarabóia" que, depois de rejeitado, permaneceu inédito até 2011. Persistiu nos esforços literários, contudo, tendo estado um bom tempo sem publicar (até 1966).

Por mais de uma década, o homem Saramago exerceu funções de direção literária e de produção numa editora. Colaborou como crítico literário na revista portuguesa Seara Nova. Autointitulado ateu e filiado ao Partido Comunista Português desde 1969, fez parte também da redação do jornal Diário de Lisboa, onde foi comentarista político, tendo ainda coordenado, por pouco mais de um ano, o suplemento cultural da editoração.

Viveu, entre 1970 e 1986 com a escritora Isabel da Nóbrega. Entre Abril e Novembro de 1975 foi diretor-adjunto do jornal português Diário de Notícias, o principal jornal português. Por conta do rigor de suas opiniões, sua ideologia política (acreditava na instauração de regime socialista recorrendo à força das armas) em plena Revolução dos Cravos e de sua metodologia de trabalho, perdeu espaço como jornalista. A partir de 1976 passou a viver exclusivamente do seu trabalho literário, primeiro como tradutor, depois como autor.

Pertenceu à primeira direção da Associação Portuguesa de Escritores e foi, de 1985 a 1994, presidente da Assembleia Geral da Sociedade Portuguesa de Autores.

À medida que ia envelhecendo, o mundo e a sociedade de seu tempo lhe mostravam nuances que a sagacidade Saramaguiana sabia definir de maneira única. Suas convicções dão conta de um projeto fracassado de uma humanidade que não deu certo, que jamais dará certo, mas que mesmo assim, não deixa de se propor à busca do progresso e da melhoria contínua de suas infinitas deficiências.

Sua vida se confunde com os enredos de suas obras: uma frieza aguda, lucidez como estado de espírito e um humor humano, sensato, austero e altivo que é capaz de captar, com total sobriedade, a essência íntima dos indivíduos.

Certa feita, um nobre amigo colombiano, também contador de história, chamado García Marquez, decretou:

"É muito difícil ler todos os livros de Saramago. Porque sua sede de expressão e seu vasto conhecimento o faz escrever vários títulos em pouquíssimo tempo. E isso é o mais extraordinário deste escritor tardio. Ele deslanchou num momento em que os escritores já estão terminando de escrever, todavia ele continua escrevendo como se tivesse 18 anos." - Gabriel Gracía Marquez

Mas, quem nesta vida pode entender os caprichos de sua sorte, que estão por aí, sempre a confrontar nossas convicções ? Aos 63 anos, Saramago viveria o que definiu como segunda vida, com uma fã, que lhe era 27 anos mais jovem.

As palavras de Saramago foram de encontro a espanhola Pilar del Rio. Ao passear em Sevilha, entrou numa livraria e leu meia dúzia de páginas de "Memorial do Convento". Não sabia quem era Saramago, nunca tinha ouvido falar, mas ficou tão impressionada que comprou todos os seus livros. Devorou "O Ano da Morte de Ricardo Reis" noite adentro e sentiu necessidade de agradecer ao autor que lhe tinha proporcionado aquela viagem literária.

A história de amor, virou um documentário em 2010. José e Pilar - Tudo pode ser contado de outra maneira. Um filme de Miguel Gonçalves Mendes, cujo está disponível no Youtube:



A mulher a quem Saramago se confiou, desde 1986, foi de fato o seu pilar. Foi, além de escritora e jornalista, tradutora para a língua espanhola de vários romances seus. A pena do velho escriba lusitano resplandecia ferina e viçosa, combativa e denunciadora, e com ela, Saramago desafiou a Santa Igreja, os Papas e todos os santos da terra. Nada lhe escapava: de Mario Soares a Lula, de Bento XVI a Ariel Sharon, de Jesus a Deus. Se fez crítico feroz da sociedade contemporânea, mas era inconteste em definir que sua arte não ajudaria a mudar o mundo.

Curiosamente, à medida que o número de seus leitores aumentava, o escritor se tornava mestre. Tomou para si um método de escrita singular, deixando muito da pontuação por conta do leitor. O reconhecimento ganhava o mundo. O talento ou o acaso não escolhem, para manifestar-se, nem dias nem lugares. Peças teatrais de sua autoria ganhavam os palcos no Brasil e na Itália, com enorme sucesso.

E já mestre que se tornara, em 1991 publicou um romance ficcional da história da vida de Jesus, de uma maneira moderna, humana e crítica da religião."O Evangelho Segundo Jesus Cristo" foi seu livro mais polêmico, que rendeu censura em um Portugal já redemocratizado e impedimento de disputar o Prêmio Europeu. A mágoa foi o bastante para que em 1993, resolvesse se mudar com a mulher para a vulcânica e inóspita Ilha de Lanzarote, no arquipélago das Canárias (Espanha).

“O filho de José e Maria nasceu como todos os filhos dos homens, sujo do sangue de sua mãe, viscoso das suas mucosidades e sofrendo em silêncio. Chorou porque o fizeram chorar, e chorará por esse mesmo e único motivo.” - Trecho de 'O Evangelho Segundo Jesus Cristo'. 

E foi em 1995 que recebeu a maior honraria literária da língua portuguesa:

"A obra de Saramago é muito bela e inovadora, recriando, por um lado, o prestígio da narrativa ficcionada e criando, por outro, um modelo de discurso aberto, em relação íntima com o leitor, com ressonância mágica, mítica e de expressão universal." 

Ganhava ali, com essas palavras do juri, o Prêmio Camões.

Mas é muito provável que o rapagote, que se transformou em mito e em mestre da literatura, não tivesse ganhado a sua fama mundial sem o Prêmio Nobel que conquistou, merecidamente, em 1998. E ele honrou o prêmio, sendo o único da língua portuguesa a ganhá-lo.

Divulgação - FJS

"O homem mais sábio que já conheci em toda minha vida, não sabia ler e nem escrever. As 4 da madrugada, quando a promessa de um novo dia começava em terras de esperança, saía para o campo, levando ao pasto a meia dúzia de porcas, cuja a fertilidade alimentava a família. Chamavam-se, Jerônimo e Josefa, esses avós. Gente capaz de dormir com porcos, como se fosse seus próprios filhos. Gente que tinha pena de ir-se da vida, porque o mundo era bonito. Gente, como meu avô, pastor e contador de histórias, que ao pressentir a morte, tratou de se despedir das árvores de seu quintal, pois sabia que não mais as tornaria a ver."
- Discurso de Saramago no Nobel - Estocolmo, 1998. 


Um Brinde à sua Literatura:


Muito se explana sobre os livros de Saramago. Em suma, sua maior influência na literatura foi a do ícone do romantismo português, Almeida Garrett, como o próprio confessava. Várias vezes, seu estilo é erroneamente é associado a um realismo metafórico (como Kafka e Jorge L. Borges). Seus textos provém de uma tendencia que não é dispersiva, e sim na narração que avança de maneira expansiva e torta (historias e historietas de gancho).

Achava dispensável determinadas pontuações, assim com há no Hebraico, por exemplo. Tratou de iniciar essa ruptura gramatical a partir do título: "Levantado do Chão". Tinha obsessão pelo discurso, sem convenções redatoriais ou quaisquer subterfúgios linguísticos que não fosse as palavras.

Por mais estranho que pareça ler um texto sem aspas, travessões e, quase, sem parágrafos, é um erro dizer que Saramago não usa pontuação em seus livros. A sacada do autor faz com que nós mesmos tratemos de pontuar nossa leitura. E faz ainda com que devoremos seu livro, sem medida.

Nestas sugestões, vamos tratar de obras de temas especulativos, onde é proposta uma situação extrema e se expõe o que aconteceria. Acredito que esta pode ser uma boa porta de entrada para o universo do autor lusitano, que é muito mais amplo.





Título: As Intermitências da Morte
 
Capa: Hélio de Almeida

Autor: José Saramago
Editora: Companhia das Letras

ISBN: 9788535907254
Ano: 2005
Edição: 1
Número de páginas: 208
Acabamento: Brochura
Dimensões: 14 cm x 21 cm x 1 cm
Formato:  Médio
Assunto: Romance / Literatura Estrangeira

Peso: 0,255 Kg
Idioma: Português





A situação se resume na primeira frase do livro: “No dia seguinte ninguém morreu”. Apesar disso parecer o sonho tão almejado pela humanidade, ser imortal pode ser algo terrível para a sociedade como a conhecemos.

Mas, da fatalidade em si, a morte também tem seus caprichos. Nesta obra, Saramago personifica a morte, um esqueleto feminino que se revolta por ser detestada pela humanidade, e resolve suspender suas atividades.

Podemos dizer que a obra se divide em três partes: os fatos, um meio termo para as consequências e a necessidade que esta sente (feminina como se apresenta) de ser amada.

E o que no início provoca um verdadeiro clamor patriótico logo se revela um grave problema. Idosos e doentes agonizam em seus leitos sem poder 'bater as botas'. Os empresários do serviço funerário quebram, 'desprovidos da sua matéria-prima'. A população aumenta demasiadamente. O governo não sabe o que fazer, enquanto igreja se desconsola, porque 'sem morte não há ressurreição, e sem ressurreição não há igreja'.

Um por um, ficam expostos os vínculos que ligam o Estado, as religiões e o cotidiano à mortalidade comum de todos os cidadãos. Mas, na sua intermitência, a morte pode a qualquer momento retomar os afazeres de sempre. Mas o que levaria ela, A Morte, reconsiderar ? Se os brutos também amam, porquê não A Morte? A sua transformação em algo mais "humano" se sucede de forma comovente.

Com certeza é mais que adequado apelidar esta obra de Saramago de "humor negro", onde reina a ironia refinada, da qual ele era mestre, como poucos podem afirmar ser. Não há margem para "poréns", pois mostra o melhor livro do autor que li até hoje!



  • Recomendando, Nota:



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    http://www.saraiva.com.br/as-intermitencias-da-morte-187525.html


    ***


    Título: Ensaio Sobre a Cegueira

    Capa: Hélio de Almeida

    Autor: José Saramago
    Editora: Companhia das Letras

    ISBN: 9788571644953
    Ano: 1995
    Edição: 1
    Número de páginas: 312
    Acabamento: Brochura
    Dimensões: 14 cm x 21 cm x 1,8 cm
    Formato:  Médio
    Assunto: Romance / Literatura Estrangeira

    Peso: 0,388 Kg
    Idioma: Português





    Repentinamente, um motorista fica cego. E uma inédita e inexplicável epidemia de cegueira atinge e se espalha pela cidade e pelo país. Mas não há trevas, mas sim uma “cegueira branca”, já que as pessoas atingidas apenas passam a ver uma superfície leitosa. Está gerado aí, o caos e o colapso do sistema como o conhecemos.

    À medida que os afetados são colocados em quarentena e os serviços oferecidos pelo Estado começam a falhar. As pessoas passam a lutar por suas necessidades básicas, expondo seus instintos primários. Nesta situação a única pessoa que ainda consegue enxergar é a mulher de um médico, que juntamente com um grupo de internos tenta encontrar a humanidade perdida. Uma coisa interessante da história é que os personagens da não tem nomes.

    Como a esposa do médico não é afetada pela doença, ela finge estar cega para ir junto com seu marido, com o intuito de poder cuidar da sua saúde e uma vez isolados ela se sujeita a tratar dele como se fosse uma criança. Mas com o desenvolvimento da trama, ela se torna uma espécie de Joana D'Arc, imbuída de sustentar a ideia de que a vida é possível, mesmo em tão terríveis condições.

    Mas o foco da trama não esta em mostrar a causa da doença ou sua cura, mas sim o desmoronar completo da sociedade que, perde tudo aquilo que considera civilizado. E certamente a arte imita a vida real e vise versa, porque são vários os episódios contemporâneos que nos remetem a isso: tragédias naturais, blackouts, guerras, etc. Tudo isso nos traz a mente imagens de selvageria, saques, insalubridade, fome e luta pela sobrevivência.

    Sem dúvida, além de uma das obras primas de Saramago, o livro é impressionantemente terrível e nos faz sofrer de forma intensa e aflitiva. Mas nem tudo na história é tortura, pânico, violência sexual e ingerência político-social. É um livro brutal sim, mas é também um manifesto contra a falta de misericórdia e a covardia que pairam sobre todos os seres humanos da Terra.


    Fernando Meirelles e José Saramago promovem o filme "Blindness", de 2008. Uma co-produção Brasil, Canadá e Japão. - Susana Vera/REUTERS

    Saramago sempre foi avesso a adaptações cinematográficas de suas obras. Mas, em 2008, uma adaptação de Ensaio sobre a Cegueira foi lançada. Dirigida pelo brasileiro Fernando Meirelles, o filme obteve críticas mistas e até recebeu uma indicação a Palma de Ouro no Festival de Cinema de Cannes. No entanto, o longa-metragem lhe agradou muito a Saramago, que o recebeu extremamente emocionado.

    Tenho certeza, após a leitura desta magnifica obra literária, de que há livros necessários para a manutenção da vida. Na verdade, esta história já deveria vir gravada na mente de todas as pessoas desse mundo. É certo que viveríamos em um mundo melhor!



  • Recomendando, Nota:



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    http://www.saraiva.com.br/ensaio-sobre-a-cegueira-347390.html


    ***

    Título: Ensaio Sobre a Lucidez

    Capa: Hélio de Almeida

    Autor: José Saramago
    Editora: Companhia das Letras

    ISBN: 9788535904802
    Ano: 2004
    Edição: 1
    Número de páginas: 328
    Acabamento: Brochura
    Dimensões: 14 cm x 21 cm x 1,8 cm
    Formato:  Médio
    Assunto: Romance / Literatura Estrangeira

    Peso: 0,409 Kg
    Idioma: Português





    Para quem já tenha lido outros livros de Saramago, esta obra denota uma certa superficialidade na exploração do tema e na própria elaboração da narrativa, que pode chegar a não entusiasmar da mesma forma, até por ser um tema político-social.


    Apesar de não se tratar de uma sequência, é inevitável a comparação com o título anterior, o Ensaio Sobre a Cegueira. Alguns personagens da saga anterior, reaparecem nesta nova epopeia. Mas a situação, desta vez, é um pouco mais delicada e mais realista. Digo realista, pois muitos de nós já ouvimos os dizeres: 'não deveríamos votar em ninguém!'

    Mas o que resultaria disso?

    Deste fato e desta questão, Saramago propõem que num país indeterminado (mas que muito se assemelha a Portugal) com toda a normalidade, está ocorrendo um processo eleitoral. No final do dia, contados os votos, verifica-se que na capital cerca de 70% dos eleitores votaram branco. Repetidas as eleições no domingo seguinte, o número de votos brancos ultrapassa os 80%.

    Daí, constitui-se uma representação realista e dramática da grande questão das democracias no mundo de hoje: serão elas verdadeiramente democráticas? Representarão nelas, o povo, uma função essencial, e não apenas meramente formal?

    Receoso e desconfiado, o governo local, em vez de se interrogar sobre os motivos que terão os eleitores para votar branco, decide desencadear uma grande operação militar de guerra para descobrir qual o foco infeccioso que está a minar a sua base política e eliminá-lo. E é assim que se desencadeia um violento processo de ruptura entre o poder político e o povo, cujos interesses aquele deve supostamente servir e não afrontar.

    É um livro que recomendo a quem já tenha lido outros livros de Saramago, como complemento à sua obra. Mas o grande feito desta leitura é mostrar ao leitor a força que o Estado exerce sobre seu povo. Independente da nação, Saramago propõe uma reflexão atemporal sobre o principal interesse dos governantes: sua manutenção no poder a qualquer custo.



  • Recomendando, Nota:


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    http://www.saraiva.com.br/ensaio-sobre-a-lucidez-148105.html


    ***


    Saramago era um homem lógico, dizia que a morte é simplesmente a diferença entre o estar aqui e já não mais estar. Deixou uma extraordinária contribuição para a literatura mundial e para a valorização da língua portuguesa, além de ter representado, com sua conduta pessoal, um exemplo de atuação comprometida em favor de um mundo mais justo e de suas convicções. Sua literatura e suas posições políticas produzem ideias e reflexões contra o individualismo e a prática do capitalismo selvagem.

    O lusitano reúne em sua obra o pensamento social e humanista que o caracteriza não só como um dos mais reconhecidos romancistas da língua portuguesa, mas também como um dos pensadores mais críticos da globalização, do mercado e das práticas que marcam homem no mundo atual;

    Quase imortal, José Saramago foi-se embora enfrentando a paradoxal radicalidade da vida: a morte – angústia de quem vive, fim de quem ama, diria Vinícius de Morais. Sua mulher, agraciada com muitas dedicatórias em suas últimas obras, permaneceu ao lado de José Saramago até a sua morte, em 2010 e comanda, atualmente, a Fundação José Saramago que tem como objetivos a defesa e difusão da Declaração Universal dos Direitos Humanos, a defesa do meio ambiente e a promoção da cultura em Portugal e em todo o mundo.

    "Tenho a reputação de ser um homem duro, seco, quase um cara de pau ou vaidoso. Mas a verdade é que sou um sentimental." - José Saramago - *1922 / +2010



    E chegamos ao fim de nossa última dica do ano.
    Esperamos que tenham gostado!
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    Aqui, agradecemos a todo o público que tem visitado nosso blog. Meus sinceros respeitos a vocês.
    Que 2017 seja um ano bem melhor para todos!

    Muita paz e boas leituras. ✌

    Até a próxima, pessoal!

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    sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

    Críticas e Resenhas #010 - O Consolador, por Chico Xavier e Emmanuel


    Para muitos, o ano de 2016 já é considerado com um dos piores anos da história. E muitos ainda dizem que a sociedade brasileira vive um atribulado momento de perdas e de encolhimento moral. Mas o que nós não esperávamos era que o quadro se agravasse e chegasse ao ponto que chegou.

    A palavra 'crise' vem sendo, por diversas vezes, entoada ao longo dos dias de 2016. O que fica latente, para a população em geral, que as bases de nossa nação e de nosso povo carece de legitimidade e ainda necessitam urgentemente de uma readequação às novas realidades que emergem.

    
    Irremediável? - Charge sobre a atual situação do país.
    David Parkins/The Economist

    Para muitos que se refugiam nas portas da , há uma clara trajetória de busca incessante de redefinição do indivíduo à luz de Deus, culminando em expiação de penas e redenção. Na crença da salvação, ao mesmo tempo, que se busca a paz de ordem psicológica e filosófica, se criam muros de intolerância e empobrecimento intelectual dos indivíduos.

    Esse processo se transforma numa espécie de paradigma da vida terrena, especialmente para cristãos. E vigora, durante séculos, como um dos processos misterioso da fé: uma eterna luta entre o bem e o mal.

    
    A tentação de Cristo na montanha, de Duccio di Buoninsegna
    Frick Collection/New York

    Diante de tantos fatos lamentáveis que marcaram o ano de 2016, os preceitos de uma vida mais aprazível, mais ajustada ou até uma cidade divina tornam-se quase que anseios inalcançáveis para nós, mortais. Mas, será que esta possibilidade é tão distante de nós?

    Os valorosos conceitos sintetizados por Santo Agostinho, neste momento, vêm de encontro com reflexões essenciais e primordiais para a nossa sociedade contemporânea, e especialmente, a do Brasil.

    "O mestre indica o caminho, mas só o aluno constrói (ou não) a informação". 

    Para Agostinho, é desse modo que se conquista a paz da alma, e esse é o objetivo final da educação e da vida.
    
    ARTE - Filósofo, Bispo e Teólogo Cristão (354-430)
    Reprodução/Pinterest

    Mas há, realmente, alguma lógica em todo esse caminho de sofrimentos, provações, êxitos e fracassos em que cada um de nós temos de passar?

    Desta forma, apresentando uma obra literária Espírita, vamos sugerir um momento de aprendizado, mas acima de tudo, uma leitura que possa mostrar, de forma simples, esclarecimentos acerca de assuntos que nos levam a compreender melhor a função da vida na Terra.


    - Contextualizando:

    Curiosamente, o que tem acontecido no mundo não é muito diferente da situação no Brasil. Tanto que a Igreja Católica viveu nesses dias, por iniciativa do Papa Francisco, o Ano Santo da Misericórdia, com o lema: "Sede misericordiosos, como o vosso Pai é misericordioso".

    Sim: apesar do paradoxo, 2016, para a Santa Sé, é o ano desse jubileu extraordinário. E Santo Agostinho, na obra "A Cidade de Deus", em meados do Século V, a sintetiza claramente nesta frase:

    "A misericórdia é a compaixão que o nosso coração experimenta pela miséria alheia, que nos leva a socorrê-la, se o pudermos".

    O pensamento político contido na doutrina de Santo Agostinho forja-se no encontro de duas tradições atemporais: a da cultura greco-romana (retendo as ideias de Platão expostas em "República" e "Leis") e a das Escrituras judaico-cristãs (da submissão humana a desígnios incompreensível, a emersão da noção de destino e da providência divina).

    Neste prisma, Agostinho teoriza, assim, os planos de uma cidade ideal: a Cidade de Deus, que está em contrapartida com a da cidade terrestre (onde predomina a guerra, a injustiça, o egoísmo, etc). Para Agostinho, a verdadeira administração de uma cidade deve estar baseada na justiça, e esta por sua vez na caridade, ensinada por Cristo.


    La Cité de Dieu (A Cidade de Deus).1400-1418: Pagãos e cristãos apontam para seus respectivos locais de culto.
    Mestre Orosius/Museu de Arte da Filadélfia-US


    Quanto ao Cristianismo, depois de Paulo de Tarso, Agostinho foi quem mais o influenciou. Sua importância foi dar corpo ao Cristianismo, universalizá-lo quanto possível, independentemente do Império Romano, que iniciava seu declínio no século V, invadido pelos bárbaros. Para dar corpo, era preciso unificá-lo já que na sua época existiam dezenas de ceitas cristãs, cada um das quais afirmando ser a mensagem autêntica do Cristo. Agostinho, a despeito de tantas teologias cristãs em litígio, rompeu o caminho rumo ao Cristo.

    Mas a contribuição de Santo Agostinho para o pensamento cristão não se limita à Idade Média. E isto se mede não só pelo número de comunicações mediúnicas (compiladas por Allan Kardec) atribuídas ao Santo, constantes na Codificação Espírita e na Revista Espírita, mas principalmente pelo seu conteúdo e significado, que traduzem a superior sabedoria de um Ser verdadeiramente cristão.


    ARTE - Trecho da Codificação.
    Reprodução/Grupo Espírita Allan Kardec


    - O Agostinismo e a sua Preocupação com a Alma


    Com Moisés, os homens ganharam dos céus a 1ª Revelação da realidade espiritual da vida. Essa revelação, que foi reunida pelo povo hebreu na grande codificação do Velho Testamento da Bíblia, sobrepunha-se a todas as formas religiosas do tempo, e conduziu o povo hebraico à concepção de um Deus Único. Mas na própria Bíblia encontramos o anúncio da 2ª Revelação, do advento do Messias, que se cumpriu com a vida de Jesus, oferecendo ao mundo a mais elevada forma de religião possível até então.

    E foi o próprio Messias quem anunciou, haja visto o "Evangelho de S. João" (Jo - 16:12, 13 e 14): a 3ª Revelação é destinada a restabelecer os seus ensinos, que seriam deturpados pelos homens, e a ampliação de acordo com as novas necessidades da evolução terrena.

    Obviamente, seria um absurdo pretender fazer um paralelo entre o pensamento de um homem que, nascido no norte da África, em 354 d.C., isto é, em plena virada da Antiguidade para a Idade Média, e o pensamento deste mesmo espírito, que transmitiu comunicações na Europa, mais de um milênio depois de sua passagem.

    Todavia, em 1863, em mensagem recebida em Paris, o espírito Erasto afirmou que Santo Agostinho seria um dos maiores divulgadores da Doutrina Espírita. Esta condição denota o seu entusiasmo e amor pelo Espiritismo. E quem foi Erasto? Como afirma a Codificação proposta por Allan Kardec, em “O Livro dos Médiuns”, no capítulo 5, seria discípulo de Paulo de Tarso.

    No Novo Testamento da Bíblia Cristã, o apóstolo Paulo faz referência a Erasto na Segunda Epístola a Timóteo. Na Epístola aos Romanos, encontramos, nas saudações finais, o relato de que Erasto tinha um cargo público em Corinto, provavelmente tesoureiro. Em meados do Século XX, a arqueologia obteve indícios que confirmam tal posição.

    Pedra de Erasto - que dizia: "Erasto, o comissário e administrador da cidade", foi encontrada nas ruinas da cidade de Corinto (Grécia) no ano de 1920.
    Divulgação/dkiel.com


    Várias mensagens atribuídas ao espírito Erasto, foram incluídas em “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, obra da Codificação de Allan Kardec, como o texto “A missão dos espíritas”. Erasto, em uma de suas comunicações ainda enfatiza que Santo Agostinho após de ter perdido a sua mãe, Santa Mônica, disse: “Eu estou persuadido de que minha mãe voltará a me visitar e me dar conselhos, revelando-me o que nos espera a vida futura”.

    Como espírito desencarnado, Agostinho reiterou temas desenvolvidos cerca de 1500 anos antes. Um exemplo é da oração, onde recomenda na resposta de O Livro dos Espíritos para a questão nº 919, que a prece e o autoconhecimento se fizessem como ele mesmo fazia quando encarnado na Terra: ao fim de cada dia, onde repassava todos os seus atos, avaliando erros e acertos.


    - Chico Xavier, Emmanuel e o Consolador



    Cena do filme Chico Xavier. Encontro com Emmanuel "...à sombra de uma árvore, na beira de uma represa..."
    Divulgação/Sony Pictures - 2010


    "Traduzindo a certeza na assistência de Deus, ela [a fé] exprime a confiança que sabe enfrentar todas as lutas e problemas, com a luz divina no coração, e significa a humildade redentora que edifica no íntimo do espírito a disposição sincera do discípulo”
    .

    Assim define o espírito Emmanuel, psicografado pelo médium Francisco Cândido Xavier.

    A Doutrina Espírita e os espíritos trabalhadores das diversas religiões espiritualistas sabem do momento grave e, há muitos anos, vem elucidando questões para que possamos compreender melhor as leis da vida. E também, para nos preparamos, na medida do possível, para as situações que iremos nos deparar no mundo terreno.


    Emmanuel foi o nome atribuído pelo médium espírita brasileiro Chico Xavier ao espírito mentor, responsável pela autoria de boa parte de suas obras psicografadas. Esse espírito era apontado por Chico Xavier como seu orientador espiritual.

    Produzindo mais de 450 obras impressas e algumas póstumas, editadas em várias línguas, obteve o volume superior a 50 milhões de exemplares vendidos em todo o mundo, segundo estimativas. Chico Xavier abriu mão dos direitos autorais de todas elas em favor de suas obras de caridade, embora fosse ele, legalmente proprietário dessas obras. Foram crônicas, contos, romances, monografias, reportagens, mensagens de auto-ajuda, com temas variados e de fundo moral.

    Destes, mais de 115 livros surgiram da parceria literária que conhecemos, iniciada em 1931, quando o mentor Emmanuel se apresenta diretamente ao médium mineiro, foram, além de diversos textos, prefácios e vários ensinamentos altamente instrutivos. Cantores como Roberto Carlos, Gilberto Gil, Fábio Jr., Moacyr Franco, Nando Cordel e Vanusa, compuseram músicas em sua homenagem e diversos músicos criaram melodias para alguns de seus textos.

    Mais que os números ou qualquer definição, o grande legado da parceria, além de toda contribuição à humanidade, ao cristianismo e ao espiritismo, é, sem dúvida, a linguagem do romance espírita empregado na evangelização. Antecessores como Kardec e Bezerra de Menezes redigiram, basicamente, livros doutrinários que mais se assemelhavam a tratados de sociologia, a um trabalho mais científico e racional.



    Título: O Consolador

    Autor: Francisco Cândido Xavier | Emmanuel (espírito)
    Editora: FEB Editora - Federação Espírita Brasileira
    ISBN: 9788573287813
    Páginas: 305
    Edição: 29
    Tipo de capa: Brochura 
    Ano: 2014
    Assunto: Literatura Espírita / Doutrinação Religiosa
    Idioma: Português 
    Dimensões:  14 cm x 21 cm x 1 cm
    Peso: 0,340 Kg




  • Recomendando, Nota:



  • Onde Comprar:
    http://www.febeditora.com.br/departamentos/consolador-o/#.WFRLblMrLiw


    Este livro constitui um luminoso roteiro para as perguntas postas pela razão e pelo coração, e é dividido em três partes correspondentes ao tríplice aspecto da Doutrina EspíritaCiência, Filosofia e Religião.

    O espírito Emmanuel lança uma nova luz sobre inúmeras questões que aqui lhe são postas e que estão baseadas no “O Livro dos Espíritos”, aborda temas como: determinismo e livre-arbítrio, ciências, fatores sociais, educação sexual, mediunidade, e reúne tópicos relevantes e atuais sobre filosofia e religião, tais como: radioatividade, gravitação, genética, entre outros. Sob a forma de perguntas e respostas este livro destina-se não somente aos estudiosos da Doutrina Espírita, mas a todos de maneira geral

    É muito confortante dispor deste material para fortalecer a fé e a busca do progresso moral. É uma obra que deve ser lida, relida e estudada profundamente, porque numa lida apenas, se apreende pouco. Há muita informação que precisa ser compreendida e assimilada.

    Pela época em que foi publicado, 1941, é um livro arrojado por trazer tantas informações, já contidas na obra Kardequiana, mas de forma simples, clara e objetiva. São perguntas que nós temos e que foram formuladas ao mentor espiritual de Chico Xavier e que trouxe primorosas respostas ao mundo sedento de conhecimento e sabedoria, enfim, o Consolador prometido que é a Doutrina Espírita.

    Aqui, não entra o quesito ser ou não ser espírita, ter ou não ter religião, mas apenas conhecer a verdade que liberta, porque como Jesus ensinava: "é preciso edificar o reino de Deus em nossos corações".

    São ensinamentos esclarecedores e propulsores para a evolução moral. Passaram-se mais de 50 anos e ainda  assim, parece que foram trazidas agora, para a nossa atual conjuntura social. Enfim, um livro de estudos, de iluminação interior e de aprendizado.

    Aqui, o Blog Canetada encerra esta resenha, agradecendo e fazendo uma pequena homenagem a Chico Xavier.

    Esperamos que aproveitem a sugestão de leitura de hoje, pois esperamos que os ensinamentos do livro tragam esperança e paz, no Natal deste ano tão atribulado, que tem sido esse 2016.

    Fiquem a vontade e comentem.

    Um abraço e muita luz a todos!
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    domingo, 20 de novembro de 2016

    Nossas Autorias #010 - Uma Maneira de Superar o Bloqueio Literário: Escrever Sobre Ele

     
     
     
     
    Por Diego Oliveira
     
     
    Que o passado não volte a se repetir! Afinal, quem o quer, de fato? Talvez ansiamos rememorar só os
    bons momentos, já os piores...
     
    Que o passado não se repita! Sem dúvida, essa afirmação é para os que tem passado por uma situação
    limite ou traumática, a melhor de todas as notícias, pois implica em uma espécie de liberação. Assim
    como escrevia Frida Kalho em seu diário, antes de morrer, "Espero alegre a saída e espero não voltar
    jamais".
     
    Todo aquele que sofre, vê na comodidade da morte uma libertação. Mas o curioso é que nem sempre temos o ímpeto de que seja ceifada a vida. Seja por covardia, seja por coragem, deixamos de lado a funesta ideia de findar a existência, e lutar pela tal liberdade de que tanto queremos.
     
    Assim deve ocorrer com a fera contida que habita nos escritores. E tenho certeza de que comigo não foi diferente.
     
    Para ser bem honesto, além dos por quês que me assolavam a mente, meus dedos e meus olhos se saturaram com o fluir das ideias e com a organização de letras, sílabas, palavras, frases, orações e com tudo aquilo que compõe as histórias que queremos criar, desenvolver, contar e eternizar. A cada tentativa, as linhas iam se embaralhando, as letras bailavam displicentes e, de repente, monstros literários emergiam de um mar branco e infinito de cada página. É como se estar na tal cegueira branca, como definira brilhantemente o nobre Saramago. Se não este, qual o pior terror do escritor?
     
    Sim, existe um outro bem pior: se distanciar das leituras. Não conseguir ler é excluir a entrada da
    história que brotará amanhã ou que ficará para sempre na memória. É mais ou menos como aquela noite de temporal, brutal e incessante: começa bem discreta e tímida, mas quando nos damos conta, já se transformou em um hiato de choro celeste, como a intempérie da fantástica Macondo, de García Márquez.
     
    Mas, de todo e para nossa sorte, as leis imutáveis decretam que, no universo, nada acaba, apenas se
    transforma. Tudo é ciclo e tudo está em eterno e constante movimento.
     
    Hoje, posso relatar a todos que não será uma causa orgânica, como uma inflamação no meu labirinto ou nas falanges metacarpianas, que me impedira de tingir de negro, a brancura do silêncio de páginas que nada dizem. Também não será as causas inorgânicas que farão o labirinto de muros se apossar desta mente inquieta.
     
    A cada letra que nasce, serão gerados os átomos que romperão as barreiras do espaço-tempo. Serão ideias que protestarão, principalmente, contra a falta de tempo na correria cotidiana, ou contra a víbora da procrastinação. Será o exercício diário contra a divagação e distração midiática e o algoz implacável da dúvida sobre a originalidade textual.
     
    Por definição, qualquer manifestação artística tem por dever, expressar a vida e a atividade humana. É a possibilidade de imprimir significado e significante aos símbolos de nossas percepções cognitivas
    sobre o mundo e tudo aquilo que o transcende. E agora, tenho a plena convicção de que não há uma forma pior ou melhor de encarar a escrita, só precisa ter a vontade de fazê-la.
     
    Por mais que um inveterado perfeccionismo se faça presente ante o resultado de uma composição, podemos nos permitir "criar lixos". E afinal de contas, quem, neste mundo, não produz lixo? E se o que estamos escrevendo é um tremendo lixo, sempre haverá tempo de embrulhá-lo e jogá-lo fora. Por mais que pareça uma frase de efeito pronta, pode ser um bom exercício, pois ao tentar, é que nos damos que escrever mal também é difícil. Mas também, isso nos trará a percepção de que não escrevemos tão mal assim.
     
    Todavia, acerca de todo o processo que passei e que qualquer um que escreve está sujeito a passar, eu
    posso me dignar a dizer que é algo que não tem medida, apesar de suas semelhanças entre os mais
    diversos escritores. Principalmente nos que iniciam neste ofício, como eu ou como você que também
    escreve. Chico Buarque observou bem, "o que não tem medida, nem nunca terá, o que não tem remédio, nem nunca terá, o que não tem receita".
     
    Outro detalhe imprescindível é de que não basta apenas o ímpeto de exercitar as palavras. É necessário aprender sobre elas. Isso, por certo e por mais trabalhoso que pareça ser, pode acabar com a euforia de quem deseja escrever. Mas é primordial que aprendamos a não cuspir, ou vociferar a esmo, palavras e ideias. E sabemos que para toda arte, há técnicas. E ao estudarmos estas técnicas, podemos segui-las, ou até mesmo desenvolvê-las. É como se propuséssemos a nós, um jogo: escrever sob o jugo de qualquer regra, por mais estúpida que ela pareça.
     
    Com a prática quando se tem um período de efervescência criativa, podemos aproveitar para propor
    desafios de conexão e desconexão, a fim de distrair a massa pensante de nossas cacholas. E, por
    consequência, se passa a investir uma fração do valoroso tempo, escrevendo, tomando notas e esboços de como todas aquelas ideais fluem incessantemente. Isso ajuda muito a superar os micro bloqueios, onde podemos recorrer a estes quando precisarmos, ou quando estiver faltando algo que buscamos desesperadamente para seguir em frente com o texto.
     
    Se a morte é, para quem escreve, a falta de ideias, lhes digo que para a cada problema terrível, sempre
    é possível criar uma bela solução criativa. Impasses, curvas, inícios, desfechos, personagens, enredos,
    amarrações e até as dores físicas que sofremos, nada mais são que convites ao autoconhecimento, ao
    trabalho e as reinvenções. Assim como se revisa um texto, nossos pensamentos, ações, práticas e
    técnicas precisam de revisão. Talvez o lixo que produzimos só precise de uma reciclagem, então, por que não o reavaliar?
     
    É certo de que as histórias não brotarão de uma mesa de trabalho, mas sim da vida. Viver, e estar no
    constante limiar de sua manutenção e do seu desafio, é o mais próximo que se pode chegar do êxito. É como se o ato da escrita fosse a eterna trincheira da guerra cotidiana e obscura que temos de travar. O êxito da autenticidade, da originalidade genuína pode nunca chegar. Mas esta certeza é maravilhosa, pois nos aproxima dos seres imperfeitos que somos.
     
    Contudo, sempre chego a mesma conclusão de que não somos nós, quem escolhem as palavras. São elas que nos escolhem. E como escolhidos, somos sempre salvos por elas!
     
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    domingo, 26 de junho de 2016

    Nossas Autorias #009 - A Derradeira Noite na Escola Mal Assombrada

     
     
     
    Por Diego Oliveira
     
     
    Já passava da 9 da manhã, e Rodolfo acabava de estacionar seu sedan na vaga costumeira, no Colégio Alma Mater. Tão atrasado como ele, estava a densa neblina daquela manhã, que teimava em não se dissipar. Talvez fosse o frio, ou qualquer coisa dessas que os meteorologistas recorrem a nos explicar nos telejornais.
     
    E já cansado de estar naquela estranha escola particular da periferia da cidade, Rodolfo, seu diretor, trabalhou se encaminhava para seu gabinete. Ao se aproximar do derradeiro corredor, viu Margarida, sua secretária. Ela nunca lhe dava bom dia. Sempre vinha com uma urgência qualquer, ou uma notícia requentada nos jornais da manhã:
     
    — Diretor, na sala há uma senhora que deseja lhe falar — disse Margarida.
    — Já está na sala? — questionou Rodolfo, inconformado. 
     
    Era comum para ele receber os pais dos alunos naquela ante-sala de sua secretária. Mas quando se tratava de alguém mais destemperado, ou mais falante que Margarida, rapidamente a secretária soturna convidava a pessoa aguardar no escritório do diretor. Assim, se livrava da presença incomoda dequele pai, ou daquela mãe. Para Margarida, todos aqueles pais eram uns idiotas com honra ao mérito.
     
    Rapidamente, Rodolfo abriu a porta: uma senhora de meia-idade, um tanto magra, olhos fundos nas órbitas e muito séria se levantava para o receber. Rodolfo a examinou a sala com os olhos, como se estivesse procurando alguma coisa que a jovem senhora poderia ter afanado ou tirado de seu devido lugar. Rodolfo nunca ligava para as pessoas. Na verdade, as desprezava. Estava cansado delas também.
     
    — Sente-se — decretou o diretor, antes que a convidada do dia lhe desejasse um bom dia.
    — O que posso ajudá-la, senhora? — Disse ele.
     
    Ela hesitou, olhou em volta novamente. Ajeitou-se na ponta da cadeira. O que diria, eram um tanto desconfortável. Mas, os anos, já havia lhe dado a compreensão exata para lidar com aquele assunto.
    Pouco a pouco, ela olhou em seus olhos e disparou:
     
    — Então vamos sem rodeios. Sou uma mentalista. Estudo fenômenos psíquicos. Sou um especialista em ocultismo, e me dedico a casas energéticamente abertas, lugares que foram invadidos por espíritos malignos. Meu trabalho é caçá-los e lançá-los fora. Os obrigo a sair, e os incentivo a encontrar a paz.
     
    Rodolfo inclinou-se contra a parte traseira de sua cadeira. Franziu o cenho, cruzou os braços, olhando para a mulher com um ar de incredulidade. Mas não a interrompeu. Apenas a observava.
     
    Ela continuou:
     
    — Crianças, adolescentes, irradiam uma grande quantidade de energia. Escolas, prédios antigos, salões grandes, podem reter parte dessa energia, e não é incomum que possam atrair os maus espíritos. Seres do outro mundo, que estão perturbados. E lhe digo: tenho certeza de que esta escola já está tomada. Então, tive o atrevimento de lhe procurar e advertir que essas entidades são perigosas. Outra coisa, é...
     
    Abruptamente, Rodolfo irrompeu seu sarcasmo, com aquilo que julgava um total absurdo:
     
    — É óbvio que está me oferecendo o seu serviço. E bem, eu vou ter que rejeitá-los. Me desculpe, mas não acredito nessas coisas. Aprecio sua preocupação, mas estamos bem.
    — Doutor, seu riso de desdêm e sua incredulidade não lhe salvará desta ameaça. Vejo por seus ombros as energias que mexem com sua aura.
    — Não é o caso, minha senhora. Por favor, tenha a bondade. — Levantou-se de sua cadeira, apontando a porta para a mulher.
     
    Ela não mostrou nenhum sinal de ter se chateado. Olhou para ele com olhos compadecidos, não se surpreendeu sua recusa. Ela sabia bem que muitas pessoas que não acreditam.
     
    — Estava certa de sua reação. Deixei com sua secretária o meu telefone. Caso venha a mudar de idéia... Eu tenho certeza que você... Enfim.
     
    O diretor Rodolfo, estava impassível em seu último gesto. O braço esticado, apontando a porta.
     
    — Ele vai — Pensou ela. Retirou a bolsa que estava sob a mesa, em seguida, retirou-se.
     
    Depois daquele torpe espetáculo, a tarde passou lentamente. O sol se escondia pelas nuvens carregadas. Era um dia cinzento, quase sem vida. A tarde já se esvaia. O diretor já terminava a última volta e as crianças iam saindo. A escola ia se esvaziando.
     
    Do barulho da algazarra juvenil, ficava apenas o tilintar do molho de chaves que acompanhava o zelador. A escola já encerrava seu expediente.
     
    Ele ficou em silêncio. Apenas o som do vento pode ser ouvido, incomodando alguns pinheiros sem folhas do pequeno pátio.
     
    Como todos os dias. Rodolfo estava trabalhando até tarde. Margarida já tinha despachado os últimos documentos da escola. Ao se despedir do diretor, lhe recomendou:
     
    — Seu Rodolfo, hoje eu não ficarei até mais tarde. Está muito frio. O Senhor vai agora? — Questionou a secretária.
     
    Sem levantar os olhos de seus papeis, o diretor respondeu:
     
    — Não. Vou logo mais.
     
    Margarida saiu, junto com os últimos lampejos de claridade do fim da tarde. Já ia longe, quando se lembrou de entregar o cartão da jovem senhora da visita vespertina ao diretor. Mas resolveu seguir. Aquilo não tinha importância. Na manhã seguinte, entregaria.
     
    Com o adentrar da noite, o frio ficava mais, e mais intenso. Rodolfo, então, decidiu sair. Já era tarde. Ainda tinha que fazer esquentar o maldito carro, para não falhar o motor durante seu retorno.
     
    Fechou seu escritório. Estava em uma extremidade do corredor superior da escola, longe da porta de saída para o estacionamento. Sentia o frio nas mãos e no rosto. Avançou um pouco mais pelo corredor, quando uma voz solitária, do interior de uma sala se fez ouvir.
     
    Ele parou. O que seria aquilo? Apurou os ouvidos, virou-se. Nada. Quando já ia seguir, ele ouviu. Era quase um sussuro, um gemido:
     
    — Diretor...
     
    Rodolfo sentiu um frio ainda mais intenso lhe percorrer da nuca e descer a espinha. Estava com os sentidos alerta. E ouviu novamente:
     
    — Diretor, aqui! — chamou. Parcecia uma voz de criança. 
     
    Rodolfo se aproximou da porta. Apoiou o ouvido à madeira.
     
    — Eu estou trancada aqui na sala. Me ajude, tenho medo — disse a voz da criança.
     
    Mais aliviado, Rodolfo disse a si mesmo:
     
    — Como poderia ser tão descuidada, estas professoras... — Ria, enquanto puxava seu chaveiro do bolso.
     
    Ao entrar no limiar da sala, não conseguiu ver nada. Esta escuro demais. Não viu a criança. Não tinha nada atrás da porta. Ele olhou para o interruptor de luz. Não funcionou.
     
    — Você pode sair ... Ei, menina? Onde você está? Está me vendo? — buscava o diretor.
     
    O quarto estava na penumbra. A fresta de luz, da porta, avançava apenas dois passos. Suas janelas davam vista para um pátio interior mal iluminado.
     
    — Estou aqui na frente — dizia, temerário.
     
    Rodolfo avançada cautelosamente entre as fileiras de carteiras. Passo a passo.
     
    Uma pancada. Ele escutou como se um estampido surgisse dentro de seu ouvido. A batida vinha da mesa do professor. Sua atenção o revolveu, a chamar a atenção.
     
    Ao se virar, viu atrás da mesa, sentado na cadeira do professor, uma silueta. Tinha um ser de semblante horrível; Acenando um cabelo bagunçado, seu corpo flácido e excepcionalmente obeso, além uma cabeça cheia de dobras e um grande barbixa que lhe caia no peito. 
     
    Aquele ser horrível, aparentemente, queria imitar uma professora, seu rosto era grotescamente anormal: barba, mistirada com maquiagem e um avental branco.
     
    Um riso diabólico e aterrador ecoou no corredor. Houve um outro ser. Flutuando perto do teto e seu corpo era como o de uma criança.
     
    Rodolfo sentiu-se fraco. As pernas estavam em falso. Ia desmaiar, mas se esforçou para correr.
     
    Totalmente trôpego, consegui sair da sala e ganhar o corredor. Sentia o suor frio lhe escorrer pela testa. Completamente pálido, saiu da escola esqueceu de fechar a porta. Não pegou o caro. Estava realmente apavorada.
     
    Atualmente, ninguém sabe o qual foi o fim de Rodolfo. São muitas versões, muitas histórias sobre o que poderia ter acontecido ao incrédulo diretor.
     
    Ninguém mais se atreve a remontar passos durante a noite naquele lugar. Dizem que ronda naqueles obscuros corredores almas penada. Passos lentos, avental branco, barbas e cabelos longos. Carrega consigo uma criança chorosa. Andam sala por sala, uma por uma, todas as noites
     
    A mentalista, que sabia o que se passava naquele prédio, nunca mais voltou. Porém, nada mais poderia fazer. Quem a repeliu, não podia mais tomar seus préstimos. Talvez, já não estivesse mais vivo.
     
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    domingo, 19 de junho de 2016

    Dicas de Leitura #009 - 3 Livros-Reportagem do C@3#*+¢ !!


    Nesta semana, e especialmente neste 19 de Junho, dia do meu aniversário, não consegui segurar: vou ter de puxar a sardinha para o meu lado e dos meus amigos jornalistas e escritores. A que nunca ouviu falar de livros de reportagens, eles contam histórias reais, apuradas e escritas com rigor jornalístico, mas que flertam plenamente com literatura. O Blog Canetada traz, nestas dicas, livros-reportagem que, com muito orgulho, estão presentes nas nossas estantes!

    Não se trata de manuais e afins mais técnicos nessa nossa lista, mas vale lembrar: isso é para ajudar a
    inspirar, como sempre nos referimos nas nossas redes sociais. Jornalismo não se aprende só nos livros.

    Buscar e contar boas histórias passa necessariamente pela vivência diária, conhecendo o ser humano, e o diferente.

    É muito bacana ter bons livros conosco, mas eles não substituem vivência, o tal do "ir pra rua", buscar a notícia. Que, por mais crucial que seja para um bom jornalismo é o que mais falta na profissão. Seja por falta de oportunidade ou de vontade.

    Nosso primeiro título é um clássico, que deu ao consagrado jornalista Audálio Dantas, o Prêmio Jabuti de 2013 (livro do ano de não ficção):




    Título: As Duas Guerras de Vlado Herzog
     
    Subtítulo: da Perseguição Nazista na Europa À Morte Sob Tortura No Brasil

    Autor: Audálio Dantas
    Editora: Civilização Brasileira

    ISBN: 9788520011515
    Ano: 2012
    Edição: 1
    Número de páginas: 406
    Acabamento: Brochura
    Dimensões: 16 cm x 23 cm x 1 cm
    Formato:  Médio
    Assunto: Jornalismo / Memórias & Biografias

    Peso: 0,570 Kg
    Idioma: Português





    O subtítulo da obra, "da Perseguição Nazista na Europa À Morte Sob Tortura No Brasil", já revela as
    rememorações de duas épocas tristes da história: a perseguição aos judeus na Europa durante o nazismo e a ditadura militar no Brasil.

    Tudo começa pela saga da família Herzog em sua fuga desesperada da Iugoslávia, para longe do horror da guerra. O menino Vlado vivia ali, sua primeira guerra e aprendeu dolorosas lições. O livro pincela como isso influenciou sua personalidade até a vida adulta. Avança também relatando a educação do rapaz, seu interesse gradual por livros e pelo jornalismo, até o ingresso na profissão, começando pelos jornais e revistas, chegando até diretor da TV Cultura, de concessão pública.

    A segunda guerra travada pelo protagonista, já no Brasil, onde se refugiar em busca de paz, foi a
    derradeira. Foi aqui que sua vida lhe foi duramente tirada, na escuridão de uma sala de tortura,
    episódio que marcou para sempre a história dessa família e da luta política aqui no país.

    É o que se expõe no caso de Herzog: a linha-dura tentava apertar o cerco enquanto que a imprensa e o
    MDB (partido de “oposição” ao ARENA, composto pelos apoiadores) buscavam avançar no processo
    democrático. Por conta do mal estar com o Governo de São Paulo, o General Geisel é obrigado a apoiar os sequestros e torturas. Vlado é chamado de comunista, de agente da KGB e, sob tortura, é feito assinar uma prova de sua própria culpa: morre pelos porões e o laudo diz que se tratou de suicídio. É aí que a reação de Audálio e dos demais jornalistas se dá: um ato ecumênico que envolve 8 mil pessoas, inclusive os estudantes, notas para a imprensa e o processo da família sobre a união.



    Não trata-se de uma biografia de Herzog, mas a obra traça os momentos determinantes da vida de Vlado. O próprio autor, revelou em algumas entrevistas à época do lançamento do livro, sobre a responsabilidade de contar essa parte da história de um dos mártires da eterna busca brasileira por liberdade:

    “A obra me custou mais de 30 anos de trabalho e representa o cumprimento de uma promessa, a de trazer de volta um dos mais importantes episódios da história do Brasil” diz o autor. “Eu tinha consciência de que meu trabalho era importante e possuía boas condições de concorrer ao grande prêmio. E também sabia que estavam na disputa outras obras muito interessantes e de grande destaque. Mas havia um fundo de esperança e fiquei muito feliz com a conquista”, ressalta Audálio Dantas.

    O jornalista Audálio Dantas em sessão de autógrafos / Divulgação: Fundação Memorial da América Latina


    A narrativa, por vezes rodeada  pela seriedade e honestidade de uma testemunha ocular dos fatos, é
    necessária a todos que querem entender um pouco mais aquele triste país dos anos 70. episódio que teve como uma de suas principais consequências o rompimento do silêncio da imprensa, narrando todas suas angústias e incertezas pessoais, tentando encontrar o difícil equilíbrio entre a firmeza que o momento exigia e a prudência para evitar que a mão forte do regime viesse a soterrar a trincheira que se tornou o Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, do qual Dantas era presidente naqueles dias tenebrosos.

    É um livro espetacular, apesar de retratar um tema extremamente triste. Só que mais que uma mera biografia, trata-se de um título de memória e de formação histórica. Pois como diz Juca Kfouri, na contracapa do livro: "ele escreve e é inscrito pela história daquele passado". E como cidadãos, é essencial rever o passado, para impedir que ela se repita.



  • Recomendando, Nota:


  • Onde Comprar?


    http://livraria.folha.com.br/livros/biografias-e-memorias/duas-guerras-vlado-herzog-audalio-dantas-1187338.html

    ***

    Para quem ainda não leu a obra mais famosa de Caco Barcellos, vai a minha recomendação. Vale muito a pena ler, pois nos é apresentada uma realidade que muitos de nós não conhecemos, ou até a conhecemos, mas de forma velada.



    Título: Rota 66
     
    Subtítulo: A História da Polícia que Mata

    Autor: Caco Barcellos
    Editora: Record
    ISBN: 9788501065261
    Ano: 2003
    Edição: 34
    Número de páginas: 352
    Acabamento: Brochura
    Dimensões: 16 cm x 23 cm x 1 cm
    Formato:  Médio
    Assunto: Jornalismo / Sociologia

    Peso: 0,540 Kg
    Idioma: Português





    Lançado originalmente em 1992, o título ganhou o Prêmio Jabuti (Livro Reportagem de 1993). Com uma narrativa contagiante, o livro aborda a atuação da polícia militar paulista, sendo mais específico no retrato ao esquadrão de elite dessa força militar: a Ronda Ostensiva Tobias de Aguiar, mais conhecida como ROTA, e o seu envolvimento com o assassinato de 4.200 pessoas ocorridos entre as décadas de 1970 e 1980.

    A história da unidade policial retrata as ações de um “esquadrão da morte oficial”, onde as vítimas eram quase sempre jovens pobres, pardos e negros e, em muitos casos, sem antecedentes criminais. Foi o resultado de uma investigação de quase uma década, para identificar todas as pessoas mortas durante o patrulhamento urbano, a partir de 1970.

    Como acontece em todos os casos relatados por Barcellos, nenhum tipo de punição é dada aos policiais, já que esses relatam os fatos como resistência à prisão e tiroteio entre “bandidos”. Em suma, o autor retrata cada caso com plena riqueza de detalhes e de movimentos, que é possível fazer o leitor sentir e até ver a cena, como se estivesse presenciando tudo.

    A obra de Caco Barcellos foi de grande importância, pois esclarece às pessoas o que realmente aconteceu com o povo brasileiro diante da ditadura pra traçar um paralelo da realidade da condição atual de segurança pública e a falta de respeito aos direitos humanos. Muitos de nós não conhecemos a realidade desses casos, mas o que tem realmente por debaixo dos panos de cada história? Por que acreditamos sempre na versão da Polícia? O que mostra o autor é que a verdade, por vezes, é omitida da sociedade brasileira pela própria autoridade pública.

    O repórter Caco Barcellos começou a sua carreira no jornal Folha da Manhã (Porto Alegre), no fim de 1973, em Porto Alegre, onde nasceu. Em sua longa carreira, jamais abandonou a trincheira da reportagem para exercer qualquer outra função que não fosse a de repórter, centrando suas matérias em dois focos: injustiça social e violência. Projetado para o grande público por seu trabalho na televisão, onde começou no programa São Paulo na TV, da Editora Abril, Caco Barcellos é hoje um dos mais conhecidos repórteres da Rede Globo, onde trabalha desde 1985.

    Caco Barcellos, com a equipe do programa Profissão Repórter, da Rede Globo / Divulgação: TV Globo


    De todo, não é difícil imaginar o porquê de Rota 66 ser considerado ainda hoje, um dos melhores livros de jornalismo investigativo do país.



  • Recomendando, Nota:


  • Onde Comprar?

     https://www.amazon.com.br/Rota-66-Barcellos-Caco/dp/8501065269/ref=sr_1_2?s=books&ie=UTF8&qid=1466384315&sr=1-2

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    Quem conhece Marcelo Rezende apenas das telas dos programas policiais vespertinos, desconhece os bastidores de uma lenda viva do jornalismo investigativo. Ao longo de mais de 40 anos de carreira, deu ao jornalista muita história para contar. E, generosamente, ele decidiu que estava mais do que na hora de contar ao público sua trajetória.



    Título: Corta Pra Mim
     
    Subtítulo: Os Bastidores das Grandes Investigações

    Autor: Marcelo Rezende
    Editora: Planeta do Brasil
    ISBN: 9788542202274
    Ano: 2013
    Edição: 1
    Número de páginas: 240

    Acabamento: Brochura
    Dimensões: 16 cm x 23 cm x 1 cm
    Formato:  Médio
    Assunto: Jornalismo / Memórias & Biografias

    Peso: 0,420 Kg
    Idioma: Português





    O livro trata de histórias narradas com o bom humor, polêmica e a simplicidade características do jornalista, que tem hoje fãs de todas as idades e em todos os cantos do país, aproveitando como título, o seu bordão mais emblemático, entoado durante seu Hard News diário.

    Ao longo das 14 histórias que Rezende tece no livro, vamos conhecendo um pouco de sua história: do cabeludo Hippie que tinha resolvido abandonar o curso de mecânica, para estagiar no Jornal dos Sports, convidado por seu primo Merival Júlio Lopes. Passou pela Rádio Globo e pelo jornal O Globo. Em 1978 foi convidado para integrar a equipe da Revista Placar, por onde ficou por uma década. Em 1988 se tornou editor do Globo Esporte. Durante a narrativa, é notório o olhar do profissional entre a diferença do trabalho na mídia impressa e a televisiva.

    Devido ao excelente nível de seu trabalho, foi transferido para o Núcleo de Reportagens Especiais da TV Globo, onde começou a se “dedicar de verdade ao jornalismo investigativo”, fazendo matérias para o Fantástico, Jornal Nacional para o Globo Repórter. Marcelo Rezende ainda conta um pouco do desafio em implementar o projeto do programa Linha Direta, para fazer frente à crescente concorrência que a TV Globo enfrentava com o SBT e o popularesco Programa do Ratinho, nos idos de 2000.

    Marcelo Rezende assina livro para o colega Marcio Canuto - Danilo Carvalho / Divulgação

    Como curiosidades, o autor fala sobre sua condenação à prisão perpétua no Paraguai e como conseguiu escapar da pena. Marcelo conta também a entrevista que fez com José Rainha, líder do ainda pouco conhecido Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. Outra história narrada pelo jornalista é a da Favela Naval de Diadema, na qual policiais extorquiam dinheiro das pessoas, em um tempo em que não se falava do que chamamos hoje de milícias. Há também um excelente relato sobre as investigações sobre o desvio de dinheiro na CBF, feito por Ricardo Teixeira, presidente da entidade à época, além das entrevistas com dois dos mais conhecidos serial killers brasileiros: Pedrinho Matador e o Maníaco do Parque.

    Uma pérola, que pode passar desapercebido ao olhar desatento durante a leitura, são os conselhos para jornalistas novatos: como propor pautas, empreender na carreira, como lidar com fontes e entrevistados, dentre outras.

    O livro deixa um bom gostinho de quero mais. Gostem ou não, o livro ajuda quebrar um pouco da imagem sensacionalista e, por vezes, chata que Marcelo Rezende explora na TV. Por traz do showman improvisado, há um excelente, corajoso e honesto repórter. Rezende ainda deixa no ar, em diversos momentos do livro, dando a certeza de que virão mais livros por aí!



  • Recomendando, Nota:


  • Onde Comprar?

     http://www.saraiva.com.br/corta-pra-mim-5711130.html

    http://www.saraiva.com.br/corta-pra-mim-5711130.html

    Espero que vocês aproveitem as dicas!
    Pessoalmente, quero agradecer sempre a vocês que acompanham este trabalho.
    Obrigado pelo carinho.
    Uma ótima semana a todos!

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