sábado, 5 de março de 2016

Nossas Autorias #007 - Homens de Preto

 
 


Por Patrick Lopes


Três homens estavam em um fliperama. Tomavam uísque e discutindo sobre o quão chatas eram suas vidas, claro que um fliperama não era lugar para três homens da meia idade. Mas lá estavam eles, se divertindo com seus copos na mão.

O mais novo do grupo tinha cabelos pretos, olhos claros, usava um terno preto muito elegante: a combinação perfeita de um homem de sucesso da meia idade. Ao lado do Caçula estava o Ruivo, que apesar de ser mais velho que seu amigo, tinha uma aparência mais jovial: usava uma camisa preta com gravata vermelha, combinando com o cabelo, que era um vermelho tão profundo a ponto de doer os olhos quando se olha de perto. E por último estava o Grisalho, cabelos brancos, rugas da idade, terno preto, porém, não tão elegante quanto seu parceiro. Esse era o mais crítico do grupo, reclamava de tudo e não concordava com ninguém. Ninguém sabia de sua vida social: ele era muito fechado e raramente falava alguma coisa sobre suas particularidades.
 

— Minha mulher só abre a boca para falar comigo sobre dinheiro e minha desorganização. Disse o Caçula.

— Por que você não muda de rotina, de mulher, trabalho? Perguntou o Ruivo.


O Caçula respondeu, bastante convicto:


— Não adiantaria muita coisa, tudo é igual. Gostaria de viver em uma realidade diferente, onde as pessoas pensem de uma forma diferente sobre a vida;


Vendo que ganhava atenção, na medida de sua inflexão, continuou:


— Estou cansado dessa mesmice que aí está! Sinto que estou jogando minha vida fora todo santo dia, quando acordo para vender meu tempo a uma empresa, que não acrescenta nada à sociedade. Só querem faturar em cima de clientes, que não sabem o que querem da vida. Estamos todos perdendo nosso tempo, dentro de um escritório com ar condicionado. Ganhamos hoje, o dinheiro que gastaremos com tratamentos médicos parar as doenças que adquirimos ao longo da nossa carreira profissional.


Enquanto pensavam no discurso do Caçula, todos do grupo tiraram um profundo suspiro de lamento.


— Concordo com você — disse o Ruivo, que estava sempre de bom humor com a vida, e quase sempre concordava com o que todos diziam.


— Não acho que exista outro modo para se viver no nosso mundo, meu caro amigo — disse o Grisalho — Se nos deixarem sem todas essas responsabilidades, ficaríamos estagnados no tempo. Ninguém pode fazer o que bem entender, o ser humano é falho.


Indignado, o Caçula complementou:
 
— Sozinhos somos perfeitos. O que nos estraga é a nossa incapacidade de lidar com outras pessoas. Somos muito egoístas, e esse egoísmo é refletido em todas as coisas ruins que existem no mundo. Alguns por pensarem que só a sua religião é certa, outros por pensarem que só a sua orientação sexual é certa.


— Você é hipócrita e egoísta, meu caro amigo  — inferiu o Grisalho, com a maior calma do mundo.


— Sim — admitiu o Caçula, no mesmo tom de voz de seu interlocutor — Exatamente como você disse: sou falho, mas sozinho, sou perfeito.


Depois de algumas horas de conversas e bebidas, os executivos seguiam às suas casas, aflitos, e repercutindo de forma vívida,  tudo que o havia sido dito pelo mais jovem do trio.


No caminho, o Caçula estava bastante bêbado e começou a perder a cabeça. Acreditando em uma teoria que acabara de inventar em sua cabeça doentia, sobre a vida ser um jogo que só acabava quando ele morrer.

Motivado o suficiente para definir que sua vida não tinha um propósito, concluiu que não aguentaria viver mais um dia sequer, sobre esta terra de pecados e sofrimento:

— Eu não aguento mais, quero ir embora daqui, não pertenço a este lugar — bradava a plenos pulmões, enquanto cambaleava por uma movimentada avenida — Esse jogo já me cansou, quero conhecer o outro lado!

E um sorrateiro sussurro lhe veio a mente, dizendo claramente:

“Se jogue nos carros, você é egoísta demais para esse mundo, ninguém precisa de você aqui”

Por alguns segundos ele se sentiu ameaçado, e todos os seus extintos entrarem em ação para a sua defesa. Ele não queria perder a vida. O que o Caçula não sabia, era que a vida já o tinha perdido há muito tempo.

Seus amigos, familiares e conhecidos nunca saberão se o Caçula estava certo sobre sua teoria. Talvez descubram quando a morte os visitar, do derradeiro instante


Mas afinal: a vida é um jogo? 



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